segunda-feira, 14 de outubro de 2013

COMPLEXOS

O mundo é cheio de complexos, dúvidas, má informação e preconceito. As pessoas concebem opiniões com a mesma facilidade que comentam a novela das nove horas. Ninguém se safa: marido, esposa, filho, cunhado, primo, vizinho, cachorro, político, atriz, etc. Todo mundo reunido ali, dentro da cabeça de cada inquisidor, prestes a ser julgado. Alguns de maneira ácida, inapropriada, mal educada e muitas vezes cruel. Há quem diga e até defenda em teses enfadonhas de doutorado que quando você critica alguém é uma forma de você aliviar toda insegurança que sente sobre si. A filosofia do tudo o que nos irrita nos outros é aquilo que nos irrita em nós mesmos. Método eficaz para quando  ver um homossexual na rua e gritar “Viado!”, “Queima-rosca”, “Richarlison”, “Pelotense”.

As pessoas realmente sentem um alívio ao comentar a respeitos das outras. As mulheres então, que o digam. São quase socialites quando se vêem acurraladas pela amiga mais magra, mais linda, com um marido mais bonito. Falsas, porém simpáticas.

Na vida de Tabajara Carneiro isso não foi diferente. Ele saiu lá de Passo Fundo, de uma família média e tradicional, e tinha sempre dois desafios quando se apresentava: Onde fica Passo Fundo e Tabajara, TA-BA-JA-RA,  é sobrenome?  Dependendo do estado, gente mal informada tem tanto quanto periguete em baile funk. A vida pode ser bem cruel.

__ Obrigado por ter ligado para TIM, seu nome, por favor.

__ Tabajara.

__Taba o que?

__TABAJARA!

__TABAJARA?

__SIIMMM, TA-BA-JA-RA!!!

__Ok senhor, e o seu primeiro nome?

O cotidiano tinha dessas coisas e quando o Jovem encontrava alguém na mesma situação, se tornava amigo imediato. Veridiano e Adroaldo se tornaram seus amigos instantâneos. Falar com alguém que sofria da mesma síndrome do nome diferente ajudava a superar o inferno das piadas.

Tabajara acreditou em si. Botou fé no seu potencial e estudou. Se tornou médico respeitado, casou com alguém que era mais linda e mais jovem, se aventurou na política e conseguiu um status que sempre quis na infância. Assim, quando a vida parecia boa e perfeita, o Casseta & Planeta, numa triste demonstração de falta de criatividade humorística, inventa as “Organizações Tabajara”.

__Ei Dr. Tabajara, onde eu compro aquele “carro disfarceitor tabajara”?

__Dr, Tabajara, o senhor vai ficar milionário se patentear aquele “Personal Pintovision Tabajara”. Eu não vejo o meu há uma década.

Tabajara só se lamentava e por vezes ria das idéias esdrúxulas. Fazia parte da vida dele. Ele só queria ser alguém com um nome normal e trivial, Marcelo, Alfredo, Roberto, Eduardo. No desespero, confessou a um amigo:

__Gerson,  até Clóvis eu aceitava, cara.

__Clóvis, Taba? Não é meio afeminado.

__Mas até ser gay é ser menos questionado.

Perguntas sobre o nome incomodavam, mas não era o grande problema.  Explicar a origem sem expor mais questionamentos era quase uma missão impossível.

__ Meu nome vem do TUPI, que era uma tribo indígena. Significa senhor da aldeia.

__ Nossa Taba, nem índio você parece. Tá mais pra alemão.

__ Estou dizendo que o nome tem essa origem, não que eu seja descendente de índios. 

__ Hum, você parece com Hans.

__ E você parece com Bráulio.

Era difícil aturar. Aeroportos então provocavam calafrios. Perder o cartão de embarque ou ficar em lista de espera era um teste de nervos. “Minha querida, não precisa chamar meu nome no microfone, estou sentadinho bem ali, é só me chamar.”

A falta de um nome comum, gerou falta de auto-estima e falta de auto-estima gera falta de personalidade.

__ Berenice, vou mudar meu nome.

__ Como assim, Tabajara, vai mudar por quê?

__Cansei, horas. Casei das explicações, das chacotas, dos trocadilhos...

__ E que nome é apropriado pra você então.

__ Haroldo.

__Haroldo?

__ É horas, Haroldo. É um nome comum e ao mesmo tempo diferente.

__ Não gosto.

__Por que não?

__ Porque quando eu gritar com você não vai ter um impacto grande. Olha só, HAAAARROOOLLLLDDDDDDOOOOO. Parece que to chamando o mordomo para trazer o papel higiênico. Que tal Heródoto?

__ Parece nome de planta estranha?

__ Claudemir?

__ Operário.

__Estevan?

__ Político corrupto.

__ Davi?

__ Bíblico demais.

__ Eraldo, Antenor?

__ Psicopata e Bêbado.

__ Quer saber, Tabajara. Muda seu nome para Eulâmpio que eu não vou parar de te chamar de Tabajara mesmo.

__ Eulâmpio?

__ Pois é, é o nome do noivo da minha recepcionista.

__ Huuuummmmm.


Depois daquela noite Tabajara teve a epifania de que num mundo onde as maldições atingem as pessoas de diferentes modos, sejam elas através de nomes estranhos ou doenças contagiosas. Porém, ele se sentia um novo homem. Iria acordar cedo no outro dia e pedir cartões de visita novos decorados com dourado no seu primeiro nome. Uma placa maior e mais chamativa também seria confeccionada para porta de seu consultório: DR. TABAJARA CARNEIRO! A vida não era tão mal assim, afinal, depois de Eulâmpio, ele passou a se sentir a pessoa mais afortunada do mundo.

Léo Carvalho - Agosto 2013

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